Paz

Ouvir-te o pairar não posso

Nem mesmo com o olhar te alcanço;

Reconheço-te o aroma de ostra fresca e inerme.

Degustar-te o fino sabor? Nem me lanço!

Sinto-te, não minto, sem captar-te a epiderme.

Temperas-me o percurso ensolarado

Aos aposentos sombrios adornas as ribadas

Anestesias-me, das batalhas, as sangradas

Teu pisar manso, salvado ao marolear das ondas,

Atenua da trupe os cascos e os clarins das rondas.

Não te enxergo a face, não te ouço,

Não te espiro nem degusto-te o gosto

Mas me extasia a ausência do teu murmurinho,

Encanta-me o balançar mansinho,

Da traineira, em teus braços, mirando-te o rosto.

Quando estás, pesca, indolente, a gaivota,

Espreguiçando-se, o entardecer beija o crepúsculo,

Da densa noite só o estrelado se nota.

Em teu alvo manto, onde não vige derrota,

Se o poder não o amarrota, o penar faz-se minúsculo.

Porém, se presente não te encorpas,

Arquivas em reminiscências o decor: Paz ausente....

Daí, tua falta te põe em alta e saltas às retinas...

Nas tropas em marcha, ouço teu aulido plangente...

Ao desabrido das atitudes vais-te... declinas...

Vai-te e faz-se o ranger dos gonzos, dos ferros!

Envenenam-te, do ódio, da inveja e da vingança, as toxinas,

Aos quadrantes ouço-te os soluços e os berros.

Então, devoro-te o amargor da ausência,

Vislumbro-te no sol que já não iluminas.

Reconheço-te perdida, ferida... pura carência!

Recomeço a sonhar... novo raiar do peito arranco!

E então, refugiado no albor da tua essência

Sonho-te colorindo-me o breu com pétalas pequeninas

De luz, de azul e de branco... De branco do mais branco!

(republicação)