À beira-mar
Chove. É copiosa a chuva.
Pelo vão do portão
de madeira enegrecido
pelo acúmulo de água,
vejo as pedras hexágonas
da rua refletirem a
luz amarela do poste.
Dou atenção ao sibilo impetuoso
do vento litorâneo. Folhas de
bananeiras, reduzidas a filamentos,
gemem inquietas, sacudidas
pelo vento no quintal
arborizado. Relâmpagos
acendem por segundos
o céu cinzento e
intimista.
Da janela entreaberta vejo
a madrugada avançar para o
negrume da noite. Aprofundo
mais o sentimento. Introverto.
Enxergo o que sinto. Nuvens se
rasgam um pouco e fulgura
outro relâmpago:
preciso apenas do necessário
para viver. É o necessário
que dá prazer!
Aqui colhemos prazeres
naturais e necessários: comer,
beber, descansar, proteger-se,
amigos, ar puro, vida.
Nossa alegria aqui é
intensa porque é simples,
feita de elementos
arquetípicos,
eternos.
"As viagens são os viajantes" disse
o poeta luso."O prazer é exatamente
do tamanho do homem" disse o
filósofo oriental.
Acertaram. Merleau-Ponty também:
"A verdadeira filosofia é reaprender
a ver o mundo"