poema bom
o poema bom não existe
existe o poema triste
o poema bom não define
o poema bom nos redime
o poema bom não assusta
o poema bom nada custa
o poema bom não se altera
o poema bom nos tolera
o poema bom desce a serra
atrás do sol da manhã
o poema bom faz a curva
e sai da estrada no meio
o poema bom quer o mato
e a gente, o seu olfato
o poema bom é sensato
e não se faz noutro ato
o poema bom se expõe
e dele a gente dispõe
o poema bom é austero
me mostra o que não quero
o poema bom é sujeito
de um objeto imperfeito
o poema bom é saudade
porque ele não tem idade
o poema bom é “Ismália”
não há o que ele não valha
o poema bom contradiz
é tudo o que a gente não diz
o poema bom é afinco
telhado feito de zinco
o poema bom é afresco
pincel pintando o pintor
o poema bom tem sabor
que a gente confunde com mel
o poema bom suga o sangue
pra iludir o vampiro
o poema bom é descalço
porque sente a força do chão
Rio, 23/02/2010