TECENDO A MANHÃ

“Um galo sozinho não tece uma manhã:

ele precisará sempre de outros galos.”

João Cabral de Melo Neto

Entre as crianças me sento.

Juntos costuramos a manhã do amanhã.

Como flor de vida, um sol bordamos.

A paz emendamos em longos pedaços,

envolvemos de abraços seu ágil pescoço.

Ah, se o amanhã soubesse

como tecemos!

Viraria seu ágil pescoço e espiaria esta tarde.

Anteciparia seu sorriso forte,

brincaria de roda na estrada.

Mas como o amanhã não sabe

se demora.

Seu vestido de paz a traça devora.

As crianças se tornam sérios senhores

e eu envelheço sem força tecente nos dedos.

É inútil tentarmos lembrar da manhã costurada!

Por culpa do vento que nos roubou a alegria

e a poeira dos dias que apaga a memória.

Ah, se o amanhã soubesse como temos esperança!

Viria correndo provar seu vestido de abraços

antes que a gente o esqueça.

Ah, se o amanhã soubesse

como tecem as crianças!

Pablo Morenno
Enviado por Pablo Morenno em 02/07/2006
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