O Velho e a Criança

Renascer não das cinzas,
do fogo ardente,

mas das gotas d´água
que tanto lavaram os sentimentos.

E ainda assim arder em chamas
como se fosse de ignez eterna,

criando vapor a ser esfriado
pelo turbulento vento do destino

até que, aquietado,
houvesse por se transformar em brisa.

Suave carícia a consolar as feridas,
que de tão estanques

jazem como guardadas em criptas. 
E, perdidas, se fazem ocultas.

Longe dos olhos alheios,
mas muito perto do próprio coração.

E é este que se desatina em prece,
que tenta clamar sincera oração.

Quer respostas que sabe inacessíveis,
quer clareza onde dominam trevas,

Quer tanto que vive a confrontar sua vontade,
forjando dorida impotência.

E nem assim desiste.
Como que guerreiro exausto,
quer resistir até o último golpe.

Não tem razão que seja rédea
para abrandar tal impulso de fúria,

Apenas frustra, apenas ensina
uma paciência para quem é ansioso.

E por serem tantos os sentidos possíveis,
por não caber o eterno no efêmero,

E o efêmero é tão próximo
a ponto de criar distância
da suposta eternidade.

Como medir? Como ter ciência experimental?
Resta a abstração racional.

Mas até onde há distância
entre o abstrair e o imaginar,
até onde o gênio não é louco?

Por tudo que se queira tristeza,
não haverá de valer uma única lágrima,

pois os olhos estão fartos de chorar,
antes querem ter o dom da visão.

Temem a cegueira, temem a mentira. 
E olhos são tão limitados...

Dura forja humana,
onde um suposto espírito
se debate com um velho animal.

Afronta de vontades,
instintos poderosos e enraizados
enfrentando a fria razão.

O individual precisa aprender
a ter senso coletivo, e em tendo,
ainda assim, não se perder,
não deixar de ser único,
não ser Deus de si,

mas sim único, e saber
tanto dos outros,
que possa ser tanto
e ter liberdade,

Sonhos ou delírios particulares
de um alucinado, sei lá,
o papel aceita tudo...

Muito será se um dia
gerar um questionamento,
um compartilhar de ideias.

Já não se espera o diálogo presente,
só não é estar sozinho, só é ser diferente,

Só é ser distante,
mesmo desejando estar perto,
mesmo que rejeitando a si,

pois cedo ou tarde,
se mantiver a lucidez,
haverá de reconhecer a solidão.

Portanto, não choro.
Não tenho um sorriso,
aguardo, pois optei
por ser servo do tempo.

Antes da paciência, 
acumulei-me de velha disciplina. 
E o corpo envelhece,

mas o impulso que há dentro de mim
apenas se aquieta, para me preservar.

E não fosse homem,
talvez desejasse ser alma. 
E fosse alma,

talvez o grande desafio
fosse ser homem. 
E, em sendo algo,

o desafio seria em não ser.
E nesse construir e desconstruir,

tudo poderia efetivamente
ser coisa nenhuma,

tirando a razão da filosofia,
o sentimento da poesia.

E a fé que gera
a vontade da criação.
Seria, então, mais pobre?

Miserável,
mesmo que adornado
pelos mais caros badulaques.

Então, que a dor nunca seja impedimento,
que a busca nunca gere certeza.

É preciso manter vivo o prazer da aventura,
o desejo infantil da dúvida,

E ver saudável encanto em olhos senis
que conseguem brilhar c
om o ardor das crianças.

Ali, talvez, pouco haja,
mas também pode haver
um pressentimento,

Um desvendar premonitório,
que se escasseia em filosofia,

mas dá asas à poesia,
e por exaustão da fé,
faz-se vontade branda.

Gilberto Brandão Marcon
Enviado por Gilberto Brandão Marcon em 29/04/2009
Código do texto: T1567224
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