A Pestinha
A Pestinha
A PESTINHA
Miguel Carqueija
É na fazenda que eu me realizo,
é o meu refúgio quando estou de férias;
é sempre aqui que eu me atualizo
pois sou sabida e não gosto de lérias.
Sou tão levada que a vovó ranheta
resmunga que eu mereço até açoite;
sou muito boa pra fazer careta,
ando descalça da manhã à noite.
Travessa eu subo pelo abacateiro,
quando me escondo não tem quem me ache;
visto suéter no galo Trigueiro
e amarro as primas pra brincar de apache.
Se dá na telha assalto a geladeira,
afago e beijo a cara dos equinos,
ninguém me engana que eu não dou bobeira
e jogo bola junto com os meninos.
Mas não precisa dizer que eu sou uma peste
e que eu sempre deixo meio mundo zangado,
que eu não sei fazer coisa alguma que preste,
porque eu sei fazer verso de pé quebrado!
Em casa estudo como condenada,
deixem que em férias viva outra vida;
podem chamar-me pestinha e aloprada,
no fundo eu sei que sou muito querida.
Olhem aqui, seus moleques, o meu nome é Aretha
e me orgulho dele, vocês ouviram bem?
Nem sei porque me chamam de Espoleta,
se duvidam meto-lhes apelido também!
Menino se mexer comigo apanha
que além de tudo eu sei me defender;
nadar no lago de mim ninguém ganha
e no entanto também gosto de ler.
Mesmo travessa sou estudiosa
mas eu relaxo se estou feriando:
ponho geleia na sandália da Rosa,
pimenta no sanduíche do Fernando.
Titio irado corre atrás de mim
mas nessa hora não tem quem me pegue;
que pena, as férias vão chegando ao fim,
deixo lembranças, ninguém há que negue.
E o vovô, quase uma praga rogou!
Não fica assim, você vai infartar!
Você sabe muito bem que má eu não sou;
peguei o teu cachimbo só pra me mostrar!
Papai, não precisa ficar tão zangado
só porque o salto alto da vó eu usei
e seu chapéu de festa eu peguei “emprestado”
e também com o vestido na vila eu desfilei;
eu só quis me bancar de garota faceira
percebe que eu estava somente a brincar?
Só quis me divertir com uma brincadeira,
inclusive quando chamei o vigário pra dançar!
E aquele lindo garoto vizinho
tasco-lhe um beijo porque eu sou sincera:
faz pena vê-lo tão vermelhozinho,
com medo de mim como se eu fosse uma fera.
Por que menino é bicho encabulado?
Por que ele foge quando eu chego perto?
Mãezinha, eu gosto muito do Machado
mas ele tem que ficar mais esperto!
Mamãe se ri: —Menina, que estás dizendo,
és muito nova para namorar!
— Mãezinha, não estás me entendendo:
na minha idade é o mesmo que brincar!
Menino, pra casa agora eu tenho que voltar,
mas a você uma promessa eu faço:
por enquanto podes respirar
mas pro ano que vem vou te pegar no laço!
Mãezinha, corta o meu cabelo bem barato
(de graça, é claro),
faz o servicinho com muito amor?
Se na hora da missa eu escondi teu sapato
no saco de ração do Faro
me perdoa por favor!
E mãezinha vê se não me corta demais
que eu também não desejo ficar carequinha:
nem precisa amarrar minhas mãos para trás
que hoje eu te prometo, vou sentar bem quietinha!
Adeus, roça amiga, pra casa vou voltar,
adeus galinhas, cachorros, gatinha, cavalinho,
adeus banho de rio, cachoeira a gelar,
a todos você deixo o meu carinho!
Mas deixo a promessa, que eu sei bem cumprir:
no ano que vem eu vou retornar!
Beijos e abraços na hora de partir
e bem sorrateira a lágrima a rolar!
LEVADA DA BRECA
Isabelle Mara
É uma menina levada da breca
como se diz lá no meu nordeste.
Não é defeito ser um pouco moleca
Estando de férias, o resto esquece...
Subir em árvore é muito legal,
cuidar dos animais é ainda melhor!
Se na fazenda isso não faz mal
Porque não curtir AO LADO DOS AVÓS?
Também vivi assim a minha infância
mesmo sapeca eu era o xodó!
Éramos muitos primos e todos crianças
Pode haver na vida uma fase melhor?
ISABELLE MARA - uma mulher terrivelmente sonhadora, orgulhosamente nordestina do Ceará onde foi revelada no que se refere às letras, pelo Professor e Jornalista JOSÉ ALCIDES PINTO a quem intitulou de MOÇA TRISTE e a comparou a AUTA DE SOUZA.
Imagens: 1 e 4, pixabay; 2, dreamstime; 3, youtube; fotografia de Isabelle Mara gentilmente cedida por Isabelle Mara.
A Pestinha
A PESTINHA
Miguel Carqueija
É na fazenda que eu me realizo,
é o meu refúgio quando estou de férias;
é sempre aqui que eu me atualizo
pois sou sabida e não gosto de lérias.
Sou tão levada que a vovó ranheta
resmunga que eu mereço até açoite;
sou muito boa pra fazer careta,
ando descalça da manhã à noite.
Travessa eu subo pelo abacateiro,
quando me escondo não tem quem me ache;
visto suéter no galo Trigueiro
e amarro as primas pra brincar de apache.
Se dá na telha assalto a geladeira,
afago e beijo a cara dos equinos,
ninguém me engana que eu não dou bobeira
e jogo bola junto com os meninos.
Mas não precisa dizer que eu sou uma peste
e que eu sempre deixo meio mundo zangado,
que eu não sei fazer coisa alguma que preste,
porque eu sei fazer verso de pé quebrado!
Em casa estudo como condenada,
deixem que em férias viva outra vida;
podem chamar-me pestinha e aloprada,
no fundo eu sei que sou muito querida.
Olhem aqui, seus moleques, o meu nome é Aretha
e me orgulho dele, vocês ouviram bem?
Nem sei porque me chamam de Espoleta,
se duvidam meto-lhes apelido também!
Menino se mexer comigo apanha
que além de tudo eu sei me defender;
nadar no lago de mim ninguém ganha
e no entanto também gosto de ler.
Mesmo travessa sou estudiosa
mas eu relaxo se estou feriando:
ponho geleia na sandália da Rosa,
pimenta no sanduíche do Fernando.
Titio irado corre atrás de mim
mas nessa hora não tem quem me pegue;
que pena, as férias vão chegando ao fim,
deixo lembranças, ninguém há que negue.
E o vovô, quase uma praga rogou!
Não fica assim, você vai infartar!
Você sabe muito bem que má eu não sou;
peguei o teu cachimbo só pra me mostrar!
Papai, não precisa ficar tão zangado
só porque o salto alto da vó eu usei
e seu chapéu de festa eu peguei “emprestado”
e também com o vestido na vila eu desfilei;
eu só quis me bancar de garota faceira
percebe que eu estava somente a brincar?
Só quis me divertir com uma brincadeira,
inclusive quando chamei o vigário pra dançar!
E aquele lindo garoto vizinho
tasco-lhe um beijo porque eu sou sincera:
faz pena vê-lo tão vermelhozinho,
com medo de mim como se eu fosse uma fera.
Por que menino é bicho encabulado?
Por que ele foge quando eu chego perto?
Mãezinha, eu gosto muito do Machado
mas ele tem que ficar mais esperto!
Mamãe se ri: —Menina, que estás dizendo,
és muito nova para namorar!
— Mãezinha, não estás me entendendo:
na minha idade é o mesmo que brincar!
Menino, pra casa agora eu tenho que voltar,
mas a você uma promessa eu faço:
por enquanto podes respirar
mas pro ano que vem vou te pegar no laço!
Mãezinha, corta o meu cabelo bem barato
(de graça, é claro),
faz o servicinho com muito amor?
Se na hora da missa eu escondi teu sapato
no saco de ração do Faro
me perdoa por favor!
E mãezinha vê se não me corta demais
que eu também não desejo ficar carequinha:
nem precisa amarrar minhas mãos para trás
que hoje eu te prometo, vou sentar bem quietinha!
Adeus, roça amiga, pra casa vou voltar,
adeus galinhas, cachorros, gatinha, cavalinho,
adeus banho de rio, cachoeira a gelar,
a todos você deixo o meu carinho!
Mas deixo a promessa, que eu sei bem cumprir:
no ano que vem eu vou retornar!
Beijos e abraços na hora de partir
e bem sorrateira a lágrima a rolar!
LEVADA DA BRECA
Isabelle Mara
É uma menina levada da breca
como se diz lá no meu nordeste.
Não é defeito ser um pouco moleca
Estando de férias, o resto esquece...
Subir em árvore é muito legal,
cuidar dos animais é ainda melhor!
Se na fazenda isso não faz mal
Porque não curtir AO LADO DOS AVÓS?
Também vivi assim a minha infância
mesmo sapeca eu era o xodó!
Éramos muitos primos e todos crianças
Pode haver na vida uma fase melhor?
ISABELLE MARA - uma mulher terrivelmente sonhadora, orgulhosamente nordestina do Ceará onde foi revelada no que se refere às letras, pelo Professor e Jornalista JOSÉ ALCIDES PINTO a quem intitulou de MOÇA TRISTE e a comparou a AUTA DE SOUZA.
Imagens: 1 e 4, pixabay; 2, dreamstime; 3, youtube; fotografia de Isabelle Mara gentilmente cedida por Isabelle Mara.