O poeta e a musa inspiradora

Poema abstrato, especulativo e mitológico.

1 Quadrinhas

Vertente

É claro que um poeta

transforma tudo em poesia;

e o que falta, ele completa

como a musa influencia.

Casal

Casal que não se separa

é o poeta e a musa:

ele, como se declara;

ela, pródiga e difusa.

Oculta

Toda poesia tem

uma face oculta inclusa,

que é do poeta também,

mas antes foi de uma musa.

Abstrata

Nem sempre a musa é concreta:

pode ser mais que abstrata;

seja calma ou inquieta,

é um ente que arrebata.

Eu mitológico

Quero ser grande poeta;

não sou poeta nem grande;

Mas Apolo, “meu profeta”,

tem a Musa que me expande.

2 Sextilhas

Logo

Além de outra qualidade

que uma musa possa ter,

tem esta complexidade:

“ser e não ser, porém ser” —,

o que dá continuidade

ao que o poeta verter.

Então qual será?

Qual deusa, qual musa é tal

que o poeta chama ou tem?

É uma aura espiritual

que o cerca e vive no Além.

Em caso excepcional,

chamando ou não, ela vem.

3 Oitava

Independente

A tal musa inspiradora

que todo poeta almeja

nem sempre vem promissora

tal qual o vate deseja:

pode até virar pastora

que o protege na igreja

como ser uma censora

do verso que ele coteja.

4 Décimas

Musa inspiradora

Pense na Mitologia,

na montanha do Parnaso*;

diga lá, conforme o caso,

cada Musa, o que fazia;

e como vive hoje em dia

cada mito do lugar;

se vale a pena pensar

na musa sem ser concreta.

Cante o que eu sinto, poeta!

que eu sinto e não sei cantar.

* Parnaso: Montanha da Fócida (Grécia antiga) consagrada a Apolo e às Musas.

Transcrito da nossa postagem Cante o que eu sinto, poeta.

Desalento

Inspiração, onde estás,

que eu te chamo e não respondes?

Onde será que te escondes?

Vais me deixar para trás?

Sem ti, eu não sou capaz

de pensar, de produzir.

Não sei o que inferir

dos indícios evidentes!

Faz dos meus olhos cadentes,

luzes que queiram subir.

A musa e o poeta

a) O que ou quem é a musa?

"O que é" musa, afinal:

é inspiração divina?

ou uma deusa peregrina

que volta ao mundo carnal?

Será uma onda astral

que paira acima de um vulto?

Há sempre um sentido oculto

na sua ausência ou ventre,

onde quer que se concentre

um espírito rude ou culto.

b) Motores da musa

Como fonte — a musa é

alguma causa motora,

junta ou mola propulsora,

reza ou palavra de fé;

a seção de “lava-pé”

quando é Quinta-Feira Santa;

uma “espinha na garganta”

com uma crise insuportável! —

é uma força imaginável

que dá coragem ou espanta.

c) Musa e poeta

Acredito que o poeta,

às vezes, não se pertence;

o que ele crie ou pense

vem de uma fonte secreta.

Uma onda que o afeta

de maneira positiva

toma conta do que ativa

o cérebro e suas funções —

de onde nascem criações,

na mais diversa deriva.

Sem musa: adeus, Poesia!

Poeta sem musa é um rio sem leito,

é uma cachoeira sem ter correnteza,

é água salobre em cima da mesa,

é chuva que não molha nem parapeito.

Não importa o nome, é do mesmo jeito:

poetisa também sente a falta fatal.

Se não existir uma fonte causal,

"adeus, poesia vivida ou autêntica",

pois a produção vai se tornando idêntica

a água empossada ou um lamaçal*.

* alusão ao "mangue".