O FÉRETRO DO VELHO CHICO
Hoje o velho Chico acordou mais assustado
Porque ouviu dizer.
Foi um sabiá ao longe que
Lhe chorou sua canção.
Não que fosse um susto inédito
Daqueles que, como raio,
Caem dum céu para incendiar os sonhos
E os destinos.
Ele já viveu muito
A sabedoria das mudanças dos cursos.
Eu ouvi dizer…
Que faz tempo que ele sabe.
Sabe, mas nunca se sabe de tudo.
Só sabe que saber é diferente do acontecer.
E como todo bom velho de guerra
Ainda cumpre sua missão que lhe foi dada,
Meandros da hercúlea auto- compensação
De integrar-se
Na reintegração da posse legítima
Do que já fora seu.
Desesperado ele já ouviu dizer
Que os Homens, esses sim!
Nunca sabem de nada.
Que, a lamentar o inadmissível,
Apenas trocam urnas por sonhos
sem fluxos
Os que, intangíveis,
sempre estão logo ali
Ao alcance dos seus olhos
Cegos ao essencial.
Apenas segue o velho cansado da guerra
No holocausto do seu leito adoentado
Encrustado de feridas cruentas!
Assoreadas pelo tudo que já lhe foi rejeitado.
Rio espelho d’água do todo que nos reflete dor.
Segue transtornado…
Sedento de matas e de cílios
Sem pestanejar
Incendiado pela insanidade
De quem não sabe cuidar…
Nem respeitar a vida.
Segue pálido, de verde perdido
Intoxicado pelos detritos
Que matam seus peixes
E suas aves,
Que roubam seu fôlego
Justo de quem sempre cede de si
Ao resiliente bebericar da vida.
Segue estupefato
E ansioso...
Pois sabe não saber de tudo.
Vi que lhe acena
Lá de longe
Seu falecido amigo do peito
Que sempre lhe fora Doce
A lamentar o seu fluxo fraco e amargo
Ambos de quase mesmo destino.
E os Homens que não previram
A desgraça,
Esses que nunca sabem de nada!
Hoje veem estupefatos
A loucura indolente dos rejeitos das suas mãos.
Vertem lágrimas anônimas
Qual a lama que desce em lava
de vulcão,
Como toda corrupção,
Sem autoria definida.
Hoje o velho Chico acordou com medo,
E eu também.
Aguardamos pelo mesmo milagre,
Qual o das gentes que sempre alimenta,
O de ver cair do céu
Uma mão que ressuscite a vida desprezada,
Assoreada e agonizante
Que corre pelo seu presumível leito de morte.
E eu…ainda aqui
A lhe cantar a poesia
Qual a dum último sabiá que lhe assovia
Um débil pio em oração.