AO PROFETA MORTO

Quando eu o vi ali,

Insipidamente desconstruído,

Minh’ alma quebrou correntes.

Foi quando meu verso se inquietou.

Ele vomitava ódio no asfalto frio

Semi- drenado pela sarjeta do tudo,

Exatamente aonde

Nos dias sucessores da noite

-A que sempre volta!-

Corpos haviam degenerado

Pela madrugada fria

Vítimas dos sempres sempre invisíveis.

Corpos sobre corpos, sobrecorpos

Aglutinados de mortes nuas e cruas

As causticamente encenadas pelas ruas!

Sacos de gente esquecida

Dentre as odisséias perdidas,

Mercadorias descartáveis

Por dentre os tufões da vida.

Falácias amaldiçoadas!

Ele soltava labaredas pela boca

Refluxos dum sangue escuro,

Coagulado pelas horas passadas

Todas roubadas da indigência.

Sem clemência,

Soavam-lhe da voz rouca

Fanhosos gritos enfurecidos de nada

Raiva!

Do seu mito despido da coroa aloprada...

Enferrujada.

Sons soavam cacófanos

Dentre a poluição urbana do tudo

Qual tela de fundo dos cenários imundos.

E ele,travestido douto em milagres...

Anhanguera desmascarado pelo

Parasitismo da dor humana,

Ali morria pouco acima do mesmo asfalto duro,

Como morre todo o fruto do nada...

diante da plateia vassala.

Já não adiantava berrar...o óbvio o sentenciva.

Morria o profeta da mesma fome

Insaciável que não soubera sanar.

Quando o vi ali...

Entre seus arranha- céus de

Abstratos concretos inatingíveis

Insipidamente tão desconstruído

No sempre mesmo palco patético

De berros inaudíveis a mim...

Senti que toda a vida quebrava correntes!

Naquela tarde que se ia...como tantas que se foram

sem magia,

Eu vi um sol semi-algemado, temeroso e pleno

Ousar renascer no cenário de horizonte cinza:

Tênues raios de novo caminho... deveras alvissareiro.

E ali minha poesia pode sentir...e ver

Quando a noite de lá correu assustada com o tudo.