O VINHO E O POETA
Brotavam pedras verdes de musgo atapetadas
e o santo sol, alvoreando a ribanceira,
desfilava sobre os tufos de carqueja amarelada;
a calma mais queimante do verão, tão prazenteira.
Então, por entre aluviões e gretas se espremia
o broto de uma videira quase sem terra enterrado;
ao ver o agreste pinho soberbo, a si dizia:
Posso não ser gigante, mas darei mil frutos adoçados...
Cingidos pela luz da primavera
nasceram cachos doces como afagos
e fulgurava a vindima em verdes bagos
protegidos pelos rochedos das procelas .
Mas eis que homens chegaram ao vinhedo
e encheram os balaios com a ambrosia;
num vinhatório, por detrás d'um arvoredo
pisaram finos cachos, segredos da alquimia.
Tempos depois, nos galpões de dornas e lagar,
fermentava a bebida, ressonando Baco;
dos tampões das pipas escorria o néctar
e gentes do lugar vinham atestar o fato.
Entre os sabores de Málaga borbulhante
brindaram todos. ---Não deixai que nada sobre!
E gravaram-se nas pipas para os tempos adiante
o nome da mais fina e pura casta: J.P. NOBRE
Ao grande poeta e amigo José Paulo Nobre