O Sísifo de Copacabana

a Carlos Drummond de Andrade

Fica agora só a solidão poética

do bronze que outrora se achava profético

mas sabemos que ícones por aqui

são apenas ícones e nada mais

as vezes um sujo cabeludo anacrônico

esbarra em seu ombro metálico

e arruma suas quinquilharias inúteis

e percorre o caminho que antes era

percorrido por seu corpo torto.

Onde fica agora sua ousadia?

Sua revolução literária?

Falou de José e acabou tendo destino bem pior,

pois, José é ainda gente, falante,

mas e você? Sussurra timidamente

apenas quando o vento teimoso

que sobrevoa o Arpoador

vem tangenciar seus ombros de bronze

e depois o mais profundo silêncio.

As vezes penso que você levantará

e sairá caminhando em busca dos amigos,

mas é apenas a ilusão artística que produz

em mim um falso movimento.

E aquela turba com suas câmeras

“flashando” e lhe guardando eternamente

numa pasta qualquer do windows

hoje você está entre ser apoio de cabeça dum bêbado qualquer

e souvenir fotográfico da malta latina.

Você que encorajou a retirada da pedra no caminho,

hoje você é pedra.

Pedras não falam, não sentem, não reagem,

talvez por isso eu escrevo estas letras,

pois sei que não pode resisti-las.

Mas entendo também de solidão poética,

pensar o que todos desprezam,

amar o que todos odeiam,

ser contraditório é uma missão.

Outro dia, um menino parou diante de ti

e ficou olhando, olhando, e depois sorriu.

Ouvi dizer-lhe: “você parece com meu tio”

As novas gerações não te reconhecem

pois a pedra que você retirou voltou ao seu lugar,

qual Sísifo tornou-se o seu evangelho.

Eu não devia te dizer

mas essa lua

mas esse conhaque

botam a gente comovido como o diabo.

17.06.07

Rodiney da Silva
Enviado por Rodiney da Silva em 17/06/2007
Código do texto: T530590
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