::: A FACE ESCRITA DO POEMA :::
Em homenagem ao Brilhante Poeta Carlos Drummond de Andrade:
Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.
(in O Poema de Sete faces de Carlos Drummond de Andrade - Obra: Alguma Poesia 1930)
Todo poema é somente a face escrita da poesia,
Tendo dela somente uma parte,
Sendo de todas as águas um rio
E de todas as chances uma única oportunidade.
Todo poema tem uma face escrita.
É tão somente um único lúdico rosto de múltiplos momentos.
As outras seis faces, Saudoso Carlos Drummond de Andrade,
Estão na vida que deixaste e que levaste...
As faces da poesia que não cabem no poema
Ficaram entre nós:
Nas ruas, nas sarjetas, nas casas, nos apartamentos...
Outras faces, porém, estão aqui, ali e aí:
Prisioneiros eternos de nossos peitos sufocados.
O mundo é vasto mesmo
E Por isso o poema é uma única face escrita de toda a poesia...
A lua, o conhaque, as pernas e o bigode foram para o poema,
Mas antes estavam no mundo...
E aqui no mundo enquanto o poeta sequestra
- Para o Poema -
Algumas luzes diferentes deste mundo
As coisas vão sendo as mais belas poesias.
Porque no papel só cabem os poemas – a arte!
E viver cabe muito mais e muito menos.
O drama que se sofre em silêncio
Só vira poema quando nos reparte.
A face escrita do poema
É castigo e estandarte...
Como disse antes: é uma única oportunidade.
No silêncio mórfico da eternidade
A poesia de nossas vidas
Veste-se de poema e nos seduz.
Inspira sordidamente por entre a nebulosa existência
O desdenhoso perfume da inspiração
E transpira-nos os poemas.
A poesia, o poema, o quadro eternizado, a escultura muda...
O silêncio de multidões de vidas.
Impávido infeliz!
Eis a prova viva da propaganda enganosa:
A capa diz: “Toda Poesia de Paulo Leminski”.
Mas eu, um infeliz, só vi a poesia escrita...
A melhor poesia nunca estará no papel.
O poema tem ponto final ou reticências,
Mas a poesia tem sempre uma nova história.
Quem disse que era fácil,
Quem disse que eu entendia?
Sei tão somente que falta algo
Em toda essa poesia!
Por isso é tão somente
De sua tragédia a face escrita
E de todo o dilema do homem
É a parte mais bonita.
Quem chora e se derrama no verso compreende
A razão de o poema ter somente uma face escrita...
Vê nele somente alguns versos de toda a sua lida!
Não bastam as velhas dores, nem de longe os eternos romances;
Não satisfazem os amores, nem de longe as despedidas.
É preciso muito mais, é preciso mais que a própria vida.
E aplausos ao Drummond,
Porque mais vasto é o coração
Que sempre o poema lapida.
Por mais que eu descreva os lábios,
Nunca caberão no poema
Os beijos que ganhei na vida...