Proseando com Pessoa, na esplanada do café A Brasileira - Chiado, Lisboa
A Fernando Pessoa:
DESPIDO DE MIM
Eu sou.
Primeira pessoa do singular,
na pluralidade que há em mim.
Nós somos.
Primeira pessoa do plural,
na singularidade que há em nós.
Entre o ser e o não existir,
entre o que sou e o que não sou,
há definidas linhas por definir,
qual manta de retalhos
remendada de mentiras sinceras,
costurada sem cerzir.
Quantos anos tinha quando nasci?
Quantas vezes amei e odiei,
Com quantos olhos vi?
Quantas vezes ri e ao mesmo tempo chorei?
Quantas vezes da própria sombra me escondi?
Tantos, tantas... quantas as peles que vesti,
enquanto de mim despido,
na fenda da alma abriguei sensações,
a realidade dos sonhos,
dores,
amores,
ilusões...
Mas ainda ouço passar o vento;
e só de ouvir o vento passar,
valeu a pena ter nascido.
Ana Flor do Lácio