ENCONTRO COM CAMILLE CLAUDEL (pela luta antimanicomial)
Camille!
Estou aqui, em tua cela em Montdevergues...
Venho te dizer que tua luz ainda brilha,
tua obra paira sobre o tempo-és imortal!
Trancam teu corpo neste claustro frio,
enquanto tua arte sobrevoa nosso tempo
e vai...
a encantar ou embalar a dor de outras almas.
Estou aqui e conturbada não me vês,
quase submersa tua mente vaga
à procura de uma luz que afague
a tua solidão neste lugar de trevas.
Amaste o escultor com tanta intensidade,
abandonada não te sustentou a tua arte;
enlouqueceste e foste acorrentada;
-ainda que mulher, um Prometeu insano-,
roubaste do Olimpo o dom da criação:
ousada insensatez dos gênios e dos loucos!
Tua mãe não pode conceber tua grandeza,
queria que ocupasses o lugar de um morto,
O filho de teu luto-o mais amado-!
Vieste para assombrar,Camille!
encerrada em seu desejo ,
tua mãe te fez espectro;
-ela que em luto eterno o Hades habitava-
compreenderia tua alma imensa?
Tua viva sensibilidade?
Banalizaste os costumes...
foste além...foste mais...
não compreendem ainda a tua arte;
tua genialidade é para esta época, o espanto:
alma feminina a se desprender do barro,
enquanto tua mente conturbada
tranca o terror em imagens delirantes.
Teu desejo de amor inteiro, alucinado...
gozo de fêmea não barrado,
sempre além...
não te coube ter apenas uma parte,
cortejavas o amor e não o amante.
-Ser mulher e artista não bastava?
Não eras parte da costela, uma qualquer...
Estrela,tua luminosidade ofuscava...
teu sopro criador transformava o frio mármore
em humanos sentimentos de amor, beleza e dor.
-Pobre Camille!
Neste inferno tua luz se apaga,
por trinta anos penará neste asilo em Montdevergues,
sem clemência de tua mãe,
sem os cuidados de teu pai,
sem a presença de teu irmão-poeta e companheiro.
Exilada, persegues um fantasma - o mais perverso-,
em constantes pesadelos, assombrada foges...
o teu algoz é o mesmo amor de outrora,
alucinado em outras formas,
nunca ausente.
Tua dor ,como garra afiada, corta nossas veias;
teu silêncio -acovarda nossa voz-estanca um grito-;
cortaram tuas mão divinas,
o que resta dilacera nossa carne;
pétrea escultura-teu corpo enrijecido-,
resiste ao tempo...
uma mortalha rota envolve tua alma entristecida.
Morrerás para sempre abandonada;
tua obra , no entanto, valerá milhões...
-Quanto valeu tua vida?
-Qual o preço de tua solidão?
-Descanse em paz,
confinada nesse útero gelado
enquanto tua obra- livre como o sol-,
aquecerá em outros tempos, outras vidas!
-Camille Claudel, escultora francesa, discípula de Rodin,
viveu por trinta anos trancada em um hospício,onde faleceu,
abandonada pela família .