Negra mãe
Negra da cor da favela
Da senzala
Que não tinha fala
Dos anos sofridos
Esquecidos
Carentes de amor
Só conhecia dor
E sobrevivia, lutava
Se entregava
Ao seu senhor
A negra do Brasil
Ou da Angola
Enfeitada de argola
Alegria nunca viu
Ainda assim, sorriu
Chorou de peito aberto
Escolheu errado ao certo
Foi humilhada
E descabelada
E ninguém chegou perto
Negra da pele rubra
Dos castigos
E dos mendingos
E mais quem lhe cubra
Descubra
É a mãe de milhões
Que negam seu quinhões
E vagam lugares mil
Interiores do Brasil
Nas matas e nos certões
A negra que amamenta
E seca o seu peito
Nunca teve direito
Mas sabe que aguenta
Fez do corpo ferramenta
Fecha os olhos e se entrega
Ela não renega
E sai fortalecida
De volta à sua guarida
Onde a fé ela prega
Negra que sabe sua origem
E tem orgulho do seu povo
Que faria tudo de novo
Cada absurdo que exigem
Mesmo lhe tendo vertigem
Ergue sua cabeça
Roga pra que não esqueça
Essa sua condição
De mãe de uma nação
Mesmo que não pareça
A negra que já sofreu demais
Nenhuma branca aguentaria
A primeira choraria
E já pediria a paz
Mas a preta perspicaz
Conhece bem seu valor
E vai além do seu torpor
Pois ela gerou o mundo
E num ritmo tão profundo
Fez bater o seu tambor