Prótese de Um Sonho
Caindo em pedaços
Suprimindo todos os sentidos
Atingindo o desconhecido
Num mergulho cego ao inconsciente
Peso insuportável sobre meus ombros
Tornando em mim amargos os seus beijos
Oh desprezível criatura
Vítima de impiedoso sofrimento
Tamanha dor a queimar-lhe os olhos
Lançando um ardente e triste desafio
Contra a própria a vida
Negros dias de involuntárias pelejas
Em que os obstáculos do dia-a-dia
Levam embora nosso vigor
Nosso sangue alimentando o escárnio e a intolerância
Nossos corações, a cada batida mais pesados
A avareza impõe suas regras e sua autoridade
Detendo nas mãos o poder da morte escarlate
Com olhos guiados pelo ódio - frenesi de magia e loucura
Sua determinação cavalgando o corcel do ópio
Enquanto do alto de suas torres, montados em suas fortunas
Charlatães da mídia imbecilizando mentes vegetais
Aprisionando espíritos já cansados de infelicidades
Através das lentes de ociosidade
Estagnando seus potenciais
Andando pelas ruas,
Vendo a cidade transformar-se em sala acolchoada
Com membros presos a camisas-de-força
Ouço em sussuros bestiais o clamor coletivo pela liberdade
Como o clangor de batalhas em eras imemoriais
Acordar em paz tem sido difícil
Nesses dias em que Judas abre as portas de seu inferno
Em que o não-nascido rotineiramente abandona o útero
Expulso pela mão da violência
O que pareciam ser as ruínas de nosso cativeiro
Revela-se agora em nossa sede insaciável
Carregada pela ganância para além da eternidade
Sei agora mais do que nunca
Nossos anseios repousam inertes na prótese de um sonho
Exposta em decomposição num altar de lamentações
Espero o cair da noite para rasgar o manto negro dos céus
Vislumbrando as estrelas
Numa viagem de encontro aos fantasmas de meu passado
E aos demônios de meu presente
Num desafio inconsciente a esse infinito pesadelo
Vejo o desespero da humanidade ante tempos incertos
Como assustados carneiros a caminho do matadouro
Encontrando o medo atrás de meus olhos
Minha alma clama pelo arrependimento
Libertando dos trilhos de um sonho louco
A locomotiva que transporta minha desgraça
[Para Augusto Boal]