Sereia da madrugada
Ao longo desses meses (dois anos, precisamente), procurando enxergar maneiras de não sucumbir a esse amor. Nada de novo. Perdido e frustrado com o tempo. Às vezes, desolado.
Não conseguindo, tentando adaptar-me a essa nova forma de ser, onde não sei se me encontrei ou me perdi, venho sofrendo de um mal que parece não ter remédio para a cura.
Ilusões, desencantos, por tudo passei e esperava estar preparado, mas não para esse canto de sereia que inadvertidamente ouvi e me entreguei, caindo num labirinto de onde não consigo mais sair.
Chega a madrugada e não consigo dormir. Penso nela. Onde estará a verdade? A realidade? Será essa minha vida uma ilusão? Por que não tenho seu olhar? Por que não seu toque?
E o tempo não me ajuda. Cada noite que passa é menos um dia de vida para mim. Sem ela.
O tempo nos afasta e ela parece não entender a minha ânsia de tê-la junto a mim. Sentir sua pele. Seu corpo. Seu lânguido olhar, algumas breves palavras, um simples toque, um beijo. Impossível?
E essa criação, gerada só pro meu prazer, se transforma na minha prisão.
Apesar de aparentemente impossível, dentro desta minha ilusão tão dura e que não retrocede nem um centímetro, sinto a beleza desse amor, vejo os desenhos dos nossos corpos se encontrando nas camas macias de alcovas onde os desejos de entrega total fundem matéria e espírito que se completam no amálgama da paixão.
E é então, nesse torpor de uma mente que se esvai de razão, perdida como se impregnada de uma poderosa droga, que me entrego à fruição de imaginá-la nos meus braços. Vejo-a ao meu lado, brincando ou caçoando. De mãos dadas na areia, numa praia deserta. Eu, ela e a natureza.
O que aconteceu? Enlouqueci, penso às vezes. Vejo-a em tudo e em todos. E essa vertigem que não passa? Não tenho mais o que fazer? Se fosse depressão, seria fácil a solução. Remédios controlados, tarja preta, mil calmantes, chás de camomila, sei lá.
Mas, e isso? O que fazer?
Quando a vejo sorrindo para mim, parecendo estar mesmo aqui, junto a mim escrevendo, numa viagem infinita e incerta, me dá medo e ao mesmo tempo alegria de tanto amar. Sem ter o seu amor. Sabendo que ela não se dá conta da grandeza do fato.
Sempre o mesmo holograma, imagem que só, já não me satisfaz.
E o movimento inexorável do tempo me entristece. Afasta-me dela. A cada minuto que passa.
E ela continua a me seduzir, maravilhosamente sutil, perspicaz e cruel, numa dança magnífica que só quem está perdidamente apaixonado consegue ver. Mais ninguém. Só ela, a atriz, e eu, o espectador inebriado, apaixonado.
E sentindo cada vez mais o peso destes grilhões de aço em meu pescoço, como um reles escravo sempre submisso à sua sinhá dona, sigo trôpego, procurando apoio para não cair.
12/11