O Canto do Guerreiro

I

Aqui na floresta

Dos ventos batida,

Façanhas de bravos

Não geram escravos,

Que estimem a vida

Sem guerra e lidar.

— Ouvi-me, Guerreiros,

— Ouvi meu cantar.

II

Valente na guerra

Quem há, como eu sou?

Quem vibra o tacape

Com mais valentia?

Quem golpes daria

Fatais, como eu dou?

— Guerreiros, ouvi-me;

— Quem há como eu sou?

III

Quem guia nos ares

A frecha implumada,

Ferindo uma presa,

Com tanta certeza,

Na altura arrojada

Onde eu a mandar?

— Guerreiros, ouvi-me,

— Ouvi meu cantar.

(...)

V

Na caça ou na lide,

Quem há que me afronte?!

A onça raivosa

Meus passos conhece,

O imigo estremece,

E a ave medrosa

Se esconde no céu.

— Quem há mais valente,

— Mais destro do que eu?

VI

Se as matas estrujo

Co'os sons do Boré,

Mil arcos se encurvam,

Mil setas lá voam,

Mil gritos reboam,

Mil homens de pé

Eis surgem, respondem

Aos sons do Boré!

— Quem é mais valente,

— Mais forte quem é?

(...)

VIII

E o Piaga se ruge

No seu Maracá,

A morte lá paira

Nos ares frechados,

Os campos juncados

De mortos são já:

Mil homens viveram,

Mil homens são lá.

IX

E então se de novo

Eu toco o Boré;

Qual fonte que salta

De rocha empinada,

Que vai marulhosa,

Fremente e queixosa,

Que a raiva apagada

De todos não é,

Tal eles se escoam

Aos sons do Boré.

— Guerreiros, dizei-me,

— Tão forte quem é?

Autor: Gonçalves Dias

Conde Diego O Poeta
Enviado por Conde Diego O Poeta em 20/02/2011
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