FEBRE IMPREVISTA
Para Mick Jagger
Relembram-me:
a lonjura se guarda no teu rosto
com a melancolia própria
dos dias que se dobram,
desde os anos sessenta.
Do que eu sei
é do burburinho alegre
estendido na água do teu olhar;
do teu corpo de mil vôos breves
pelo palco, a se quebrar como rosas d’água
para depois recomeçar;
da tua voz, essa febre imprevista
contraindo as sombras como um sol
a pino.
Não dividiremos qualquer culpa
seja a de guardar só para nós
uns pedaços de céu,
ao fundo de alguma paisagem seqüestrada
pelas máquinas de fotografia,
seja a de trocarmos acusações impróprias
na queima tola dos ciúmes,
ou a de apagarmos prematuramente os dias
entre a lisura silenciosa dos lençóis
perfumados a sol.
Mas nada disso me aporrinha
a não ser a exatidão perversa da ventania
dançando entre as notas da guitarra
e os teus cabelos...
nunca te desalinharei os cabelos
por causa deles os meus dedos se digladiam
inertes
como eu.
Cissa de Oliveira
19.02.05