ESTRANHOS

A quem amei ou amo e que perdi, ou simplesmente a pessoas que passaram por mim no tempo e que se perderam como lágrimas na chuva

ESTRANHOS

Já fomos um mundo

Profundo

Um Universo

Onde tudo corria tão bem

Que parecia correr em verso

Areia da mesma praia

E que nem o mar

Soube

Separar

Estrelas do mesmo céu

Abençoando o sonho dos amantes

E desejando

Que o teu também fosse o meu

Poesia

Onde cada palavra minha

Era preenchida pela tua

Porque sem Ti

A minha alma

Se encontraria vazia

Uma orquestra

Tocando na mesma diapasão

Que abraçava o tecto do teatro da vida

Onde tocávamos

E assim tocava a imensidão

Éramos um e só um corpo

Ocupando o mesmo espaço

Não pedindo desculpas pelo apertado

Sendo isso um prazer

E não um embaraço

Sendo língua e lábios

Da mesma boca

Que se estavam sempre a tocar

Fazendo o som do amor

Pois era assim que ao mundo

Nos fazíamos recordar

Éramos Terra e Lua

Orbitando

Sempre e sempre

Em torno um do outro

Voz infinita

Que não se esgotava

E em que era impossível

Ficarmos roucos

Até que de repente

A conjugação de afectos

Deixou de fazer sentido

E Tu não querias estar comigo

Nem eu contigo

E houve o natural vazio

Que procurámos preencher

Em corpos estranhos noutros tempos

Mas agora familiares

Pois não há nada pior para um espírito devoluto

Do que a falta de um lar

Ou em copos

Montanhas de copos

Que algures

Estavam à espera de os beber

Como se a tontaria de uma embriagues

Colmatasse realmente alguma vez

A premência de te ver

E de te querer afastada

Para o outro lado do cosmos

Onde não te possa visualizar ou sentir

E rever aquilo que já fomos

Porque a grande roda da vida

Essa não para de girar

E onde contávamos que estivesse um e outro

Esse um e outro

Está agora

Num conhecido

E bem desconhecido lugar

Fazendo a rima

De que já não te amo

Nem tu a mim

E na força linguística de apelidarmos o que somos

Passámos a essa palavra terrível

Passámos a ser

Estranhos...