AOS VERMES
Se desse sonho eu caio,
desfaço profundamente e desmaio,
a rudeza do solo fechando o cerco,
e por um vago momento me perco
na orgia desse sono abstrato;
que tenta me manter intacto,
como se eu fosse objeto caro,
caído amiúde, pelo sono varo,
como quem desconhece seus limites,
sou sem sono, sou sem apetite,
vago por essa discórdia tanta,
como quem tem nó na garganta;
e durante o episódio que vivo,
me desgasto, me enfureço, me sirvo,
à maneira dos ratos, desgasto os nós,
somos multidão quando estamos sós;
nos sentimos atarantados e vazios,
entornamos o caldo, os desafios
descem goela abaixo, nos sufocando,
como quem vai perdendo o mando,
sentindo esvaecer o conjunto todo,
ao modo dos vermes, come-se o lodo,
estando ali próximos demais ao solo,
como se a decência saísse pelos poros;
ao reerguer, somos acometidos pelo desejo,
um força nos arremete ao chão com o peso;
estamos aos vermes então nivelados,
somos mantidos seguros e pisoteados,
na desfaçatez humana que nos segrega,
ameaça-se a reerguida e se escorrega...
2.003