Segredos

02/10/07

Eu não quero saber do teu dia

Nem saber o que comeste

Se o teu chefe te elogia,

Se ele mente ou se ri

Do capítulo da novela

Onde fostes ontem à noite

Nem da vida da tua amiga

Não quero noticias da família

Se teu pai está “bonzinho”

Se tua mãe tá com flebite

Se teu irmão tomou viagra

Se tua irmã está infernal

Se tu dormes mal ou bem

Se o Brasil não tem mais jeito

Do serviço de amanhã

Do almoço de domingo

Do amassado do teu carro

Bolsa nova, cinto novo

Do novo comercial

Não quero o city tour a mil por hora

“Olha isso, olha aquilo”

Tudo superficial

Quero de ti tuas masmorras

As tuas mais profundas criptas

O esgoto de cada prédio

Cada alicerce, cada tijolo

Que compõe a tua essência

Mausoléus e catacumbas

Corpos em decomposição

Água verde e insalubre

Todos pequenos meandros

Dos Tietês da tua existência

E quero, sim, sem resistência

Quero acesso irrestrito

Ao sórdido, ao pútrido e ao infame

Um exame detalhado

De tudo aquilo que escondes

De mim, de ti, de todos

Os engodos, as mentiras

Investigar cada recanto

O lado negro da tua alma

Conhecer-te bem melhor do que a ti mesmo

Devorar-te os pensamentos

Dilacerar teu inconsciente

Alimentar-me da indolência

Nutrir-me da inconsistência

Devorar o que ninguém mais sabe

O que nunca foi de alguém

Seus conteúdos mais secretos

Seus segredos mais insanos

Escavando as profundezas

Nos porões, nos catres sujos

Que povoam tua mente

E impedir que te escondas

Sob a areia, sob o vime

Ocultar o invisível

Por detrás de mil cortinas

Mil vidraças de amianto

Resgatar-te do abismo mais profundo

De onde impede-me o vislumbre

Daquela que realmente és

Pois eu sei,

Morres de medo

Que eu conheça o teu segredo

De tua vida eu desvendar

Dissecar o teu refúgio

Conhecer-te por inteiro

Pois bem sabes,

Sob a lente

Finalmente serás minha

Corpo e mente, fogo e alma

Da minha alma componente

Insolúvel, indivisível...

Prisioneira para sempre!