Quando o Amor Acontece
Andei pelas ruas
Lamacentas, molhadas
Escuras sinistras...
Vultos iam e vinham
Guarda chuvas brilhavam na escuridão
Gritos, sussurros, choros, risos, solidão...A depressão
Sufocava a minha alma dilacerada, oprimida
Pela dura desilusão, sonhos perdidos, desfeitos
Amor efêmero de noites quentes de verão...
A cidade estava as escuras, me inquietei
Pequena cidade montanhosa, gelada...
Sai sem rumo, buscando algo novo, novas sensações...Inspirações.
Queria sentir a chuva fina a lavar meu rosto, gélido, descorado.
Na noite turva, em plena madrugada fria...Invernada.
Queria chorar um amor perdido, resinificar as lembranças,
Sentir saudades...Preencher o vazio.
De repente ao tropeçar em uma pedra
Gritei um enorme palavrão, voltei ao chão, finalmente!
Ao meu lado, olhando-me com olhar cauteloso e sereno
Estava um espectro, uma assombração!
Com um cachimbo aceso nos lábios, bem agasalhado
Cabelos grandes dourados, amarrados num rabo de cavalo
Um ser, um sorriso, uma saudação.Olá!
Sai correndo ofegante, pensando em alma errante
Precisando de oração. Gritei: Deus, o que fazer?
De tanto correr escorreguei, no calçamento me joguei
Enfim, apesar da dor me livrei daquela maldição!
Sem me dar conta levantei apressadamente
Segurei na mão estendida, enluvada, tremulamente
E nos seus olhos fitei, sem poder articular uma só palavra.
Quase senti um desmaio, ao pressentir
Que aquele homem não era o demônio,
Nem tampouco uma assombração
Era sim um anjo, travestido de humano, ou quem sabe? um deus grego,
Um poeta sem sono, um andarilho sem rumo,
Em busca de inspiração...
Com ele segui adiante e, após longa conversação
Entrei em seu habitat, um rústico e elegante casarão,
Conhecer a sua intimidade encheu-me de emoção!
A luz retornou, o encanto continuou...
Recitou poemas ao som de Chopin, falou da vida e da poesia
Da historia e da dor, da sede de justiça, da cidadania
Do amor, da alegria e da beleza do amanhã!
Observando o crepitar do fogo na lareira, a chuva pela vidraça
Não pensei mais na depressão, mas sim, no providencial encontro
Pelas ruas molhadas, na penumbra de um aposento
E no palpitar do meu coração em ebulição!
Poeta, senhor da sabedoria e sensibilidade envolvente
Poder de sedução!
Sorvi o néctar dos deuses no Olimpo, que saudades!
No corpo quente e acre, nas montanhas geladas
De uma lendária cidade!
À luz de velas dançamos o vai e vem orquestrado
Pelo som ofegante da respiração. Recordação!
Nessa noite sombria, consumamos o ato que o desejo exigia
E assim, bem enamorados, demitimos a solidão ao raiar do dia!
Quem disse, que no meio do caos, não existe salvação?
Ainda hoje, nos lembramos da lição: a pedra e o tropeção
Foi à forma do cupido aproximar os dois poetas
Involuntariamente ermitões!
Na lama, nasce uma bela flor
Através da dor, também poderá nascer
De fato, um grande e duradouro amor!