BEIJA-FLOR
As pipas eram âncoras da infância
onde a gurizada serpenteava
inocentes mensagens coloridas
semblante apolíneo da tarde estival.
Naquela época paulificávamos
os vizinhos em múltiplas invenções
de peraltices esdrúxulas.
Preso na trajetória fosforescente
delírio da explosão
inesperada dos sentidos.
Eu a vi pelo vão generoso
da janela horizontal.
Sem consciência de nada
que cercava-me
perfurei minha pele
suores de anseios úmidos.
Uma epifania no instante
raro de nudação.
Todos estavam distraídos
empinando a alegria pueril.
Eu apenas fixo
em pensamentos oníricos
cravejado pela beleza ardente
de uma flor vulcânica.
As indústrias Cantareira
cerravam as portinholas ogivais
que o tempo oxidou lentamente.
Homens com uniformes sujos
iluminavam a procissão das horas.
A tarde sacerdotal
dirigia a cerimônia litúrgica
entre os turíbulos do templo.
Dentro de mim córregos ígneos
larvas incandescentes
nos cem mil quilômetros
de veias, vasos e artérias.
Vislumbre chamativo
convite agradável nas entranhas da arena
leões da África famintos
vociferando em aldeia.
Meus tremores febris e cárneo
corta-me essa lâmina exata
estado incontrolável de querer.
Meu coração agita-se como beija-flor !
As pipas, os meninos absortos
na odisséia do firmamento.
Eu extático , néctar de sentir, provar
Forevemente , a sensação suprema dos mortais.