Donepezila

É, vovó…

Diagnosticado o Alzheimer, seu neto virou um inventor

De invenções parecidas com as que nos contam enquanto crianças

Fada do Dente, Papai Noel, Coelho da Páscoa

Quaisquer fantasias que deixem a realidade mais leve, menos chocante

Era a minha vez de fabular os acontecimentos, por você, incompreendidos

Inventei que a sua bengala era um cetro, de uso obrigatório pela rainha do nordeste

Inventei que as enfermeiras eram suas vizinhas

Inventei que o acesso em suas veias eram pulseiras

E a cânula de oxigênio, um colar

Inventei que o hospital era meu local de trabalho

E a senhora só estava lá pra ver o que faço

Inventei que os remédios eram apenas vitaminas

Inventei até um passado menos sofrido para a senhora

Inventei que aquela minha roupa, sua favorita

Foi você mesma quem costurou

Tentei ser o Donepezila da Dona Luzina

É o meu mal… foi pro seu bem

Se a senhora pudesse inventar, pelo menos, alguma última coisa

Um céu todinho estrelado a repousar

Um pijama, um siricapê bem batucado na mesa, um último Sonho de Valsa

Ou, inventa pra mim que você será um fio, fia!

O fio condutor da mais bela costura que já teceu - a familiar

E deixa que a gente segue costurando a vida por você