TANGO

Na maré cheia algas verdes

Trazidas à praia, enroscam se

Como polvos imaginários

abraçam nossos pés

com seus tentáculos

Somos dois estranhos

À frente do verbo amar

que não se define nunca

O amor está em ruínas ?

O amor é mar ?

É morte o amor

que se põe à amar?

O amor tem mãos frias

O amor é réquiem

Elegia do amor :

o amor em blues

Filete de cristal

.pedaço de concha

Casca de coral

Filigrana

Eu que não sei falar de amor

Além do amor ao coletivo

Eu que suponho amar

sinto agora nos dedos do pé

a areia áspera, rascante

argila que sepulta amor

Quem ressuscita o amor ?

Os que viveram guerras

Íntimas e intransferíveis

pelos desertos do mundo

Amor, guelra de peixe

Por onde circula ar

As gueixas submissas

desnudam se ao amor

O amor que per si

insiste em ser poema

Pois poetas , esses loucos

em cuja mente em branco

se colore a palavra amor

Inventaram o verbo amar

Como um fóssil numa pedra

destino milenar inscrito

em sânscrito : uma odisseia

uma novela , um drama

O amor pelos tempos

das pestes, do cólera

da inquisição

Do tablado de Shakespeare

ao teatro do absurdo

O amor de Bizet, o amor

de Carmem ,das carmesitas

O amor proibido dos padres

O amor interdito de Agnes

dos balcões de Verona

ao amor livre em Woodstock

Amor não se conjuga

O amor é um tango

Onde está senão alí

Sobre areia , declarado

Até que uma onda o apague

MARCIA TIGANI