ALTAR

Meus olhos se ajoelham num altar todos os dias

Penso no tempo de sonhos e de encontro de almas

Canonizo sua imagem insistentemente

Suspiros de novelas, histórias de heróis,

Fantasias de um amor eterno

Eu venero tudo o que não dividimos

Os filmes a que não assistimos,

As músicas que não cantamos,

As viagens que não fizemos,

Todas as dores que não sentimos,

Os poemas que deveríamos escrever

Minha saudade é santificada

Ofereço aos santos

Os sonhos que só eu sonhei,

Os risos que foram só meus,

As insônias não divididas,

A avenida que jamais atravessei,

As ruas pelas quais me recuso a andar

Apresento neste altar

Sua ausência tão presente

E nesta minha oração bendita,

Ouço sua voz que já não me grita

Tento esquecer seu riso sagrado

E entender seus olhos que não rezam com os meus

Confundo minhas orações com preces suas

E peco com meus dedos em sua boca santa

O incenso percorre meu ar e se confunde com seu cheiro

Cantarolo uma Ave Maria,

Último suspiro de minhas lembranças

Procuro riscar alguns sonhos meus,

Tempestades solitárias que elevo e oro neste altar

Canonizo este momento e beijo algum anjo

Venero seu sorriso no meu silencioso altar

E suspendo meu véu vagarosamente.