O AMOR

O amor não é senão gozar uma coisa e unir-se com ela,

Nascido do conceito e do conhecimento que temos do objeto amado,

Que se for perecível, finito, mortal é um flerte fatal com a dor,

Pois que, por sua natureza, está fora de nosso poder limitado.

O amor converte o amante e o amado numa coisa só,

Formando um todo grandioso, admirável e magnífico.

Onde devemos nos submeter humildes e submissos,

Já que nele não mandamos, e sim ele que comanda.

O amor não está no que queremos, desejamos, amamos,

Mas no que não escolhemos, já que a escolha se dá em função dele.

Não é um jugo que se carrega, um senhorio que nos explora;

Mas um bem-fazer que nos transporta, um anfitrião que nos acolhe.

O amor não é um dever, pois não coage, impõe, coíbe – uma tristeza.

Mas sim uma virtude que liberta, ablaqueia, emancipa – uma alegria.

Se por um lado é um mandamento, que não seja um amor prático;

Seja antes um ideal de santidade, iluminado e guiado por ele.

O amor não nasce ou se reduz à sexualidade,

Não se expressa apenas através dos sentidos ordinários.

Singular e onipresente, nele existimos e nos movemos,

Fomos criados e criamos: ele nos alimenta se retroalimentando.

O amor é deixar de fazer o que se faz, algemado ao egoísmo,

Ou deixar de fazer o que se deve, subjugado à obrigação.

Ele anima o espírito dos Evangelhos, pleno de sabedoria,

Resumindo sua ética: “ama e faz o que quiseres”.

O amor é o alfa e ômega de tudo, num círculo virtuoso,

Do amor que nos é possível ao amor como única possibilidade.

Dois amores diferentes que se transformam nos transformando,

Mudando de objeto, de natureza, superando-se até seu mais belo êxito.

O amor se dá quando a força não se serve da fraqueza demonstrada,

Que recua dois passos ao invés de ocupar o espaço do passo recuado,

Que se abstém de impor potência para oferecer liberdade, que abdica,

Que renuncia à plenitude do ego, servindo antes que ser servido.

O amor não é mais a falta, a paixão ou a cobiça – Eros,

Ou apenas amar os amados que nos amam – Philia,

Mas sim aquele que não conforta mais o ego e que dele nos liberta,

Que leva ao esquecimento de si, o amor desinteressado, puro – o amor Ágape.