O último poema
Não tenho mais nada a dizer
O nosso rico vernáculo se fez pobre
Me faltam palavras e argumentos
Quem diria, eu, mestre dos versos
Exausto em verso e prosa
Lá se foi o repertório de amor
Eu, exaurido de palavras de ódio
Me reservo em minha solidão
Quando Nietzsche chorou
Abdicou da humanidade
Reservou a si a loucura
Eu ainda não consegui chorar
Resoluto, em horas minutos e segundos
Me abdico até de pensar, de lembrar
Calo na boca os verbos infames
Tranco na garganta as frases de amor
O poema se encerra aqui
Deixe de ler agora, ignoto leitor
Fraterno amigo
Doce poetiza
Se optarem por continuar
Prometo os amores mais servis
E as dores mais cruéis
Que um coração pode suportar
Depois da idade madura
Eu me dispus a amar
Repleto de passado
Porém ávido de futuro
Me deixei levar
Me propus recomeçar
Fui amigo, amante companheiro
Naveguei em seus sonhos
E me deixei navegar
À trouxe aos meus sonhos
E aos sonhos dela me deixei levar
Amei seu filho, suas dores, seus amigos
Mergulhei em sua vida
Pois sua vida era meu mar
Seu ventre foi minha perdição
Seu gosto, seu cheiro de paixão
Dediquei o melhor de mim
Ofereci o meu melhor tempo
Mergulhei de peito aberto nesse mar
Eu quis fazer filho
Imaginem meus caros
Que fruto lindo haveria de ser
Eu quis morar junto
Imaginem meus leitores
Que história estaria por vir
Por favor, pare de ler aqui
Respeite o momento angustiante
Dessa velha alma errante
Errante porque erra em demasia
Perdida nessa utopia
Transformo velhas palavras
Acolhido por esta noite fria
Você vai continuar a ler?
Está por sua conta e risco
Os fatos que tenho por dizer
Cabem só a nós o risco
Esse amor que me dispus a viver
O vivi em sua plenitude
A ela ofereci homens
Abri mão da minha masculinidade
Minha maior virtude
Não há hombridade maior que essa
Ser fiel à mulher que dorme com outro
A maior prova de retidão
Hoje ela não me quer mais
Zomba com a história que construímos
Diz que não sou homem
Que não tem paixão
Que não há tesão
De fato, me apequenei demais
Eu deveria dormir em paz
Fui homem até não poder mais
Hoje me encontro dividido
Entre a loucura de internação de Nietzsche
E a estrada que me leva ao futuro
Qualquer caminho que me devolva o sono
Poeira, montanha ou mar
Onde a vida me levar