OLHOS FAMINTOS
Quando olho em teus olhos castanhos
Me visto com as asas de tuas pestanas
E voo clandestinamente nas tuas entranhas
Neles me batizo renasço me banho...
Teus olhos com pupilas de negrume
Dois buracos negros me envolvem
Me seduzem como moscas no estrume
E como gados miudos me fazem nuvens...
Qual uma cruz dois caminhos
Uma me seduz qual vinho
A outra amarga minha boca
E despeja minha bílis na doca
Teu olhar é cantilena de sereia
Me sinto leve, o longe é breve
O calor é transformado em neve
E o ouro da praia vira areia
Teu olhar como planta carnívora
Me devora mas morro embriagado
No cálice do mais puro melado
Como turistas atraídos por Évora
Teus olhos qual duas fontes
Onde Dionísio fabrica seus vinhos
Quando deles bebo sem fim horizontes
E os montes são meus vizinhos...
Quando abertos são um mergulho
Na capilaridade das vitórias régias
De tuas pupilas em que marulho
Como aluno quando sai de férias...
Abertos são meu alvará de soltura
Mais quando se fecham pra explodir em baga
Ainda sou como ave faminta e notívaga
Que se alimenta de tua carne crua...