A ridícula ideia de nunca mais
O giro da terra me acorda
E diz num sopro bem manso
Pra acabar o descanso
Logo esquecer de sonhar
E deixar só o remanso
Vai, bora levantar
Como é que se acha calma
Como que se livra disso
Dos rios que você deixou
De algo que demorou
tanto muito pra encontrar?
Como que se engole um choro
Que me sai por onde eu entro
Lá na janela da alma
O de fora e o de dentro
Tudo inteiro pra chorar?
A poesia é meu foguete
Imaginando que você já vinha
A haste fina, o aríete
Que aperta a boca do estômago
Comprime lá no meu âmago
Me faz pensar que es minha
De tantas dores possíveis
Porque escolhi logo essa?
Viver, amar, tudo pressa
Das coisas mais invisíveis
E se eu sofrer tudo logo
Da tempo de juntar as peças
Ontem foi dia do livro
Página não pode molhar
Passa ano e não me esqueço
Do vestido sol me lembro
Desse peso eu não me livro
Fica ali fazendo fresta
Bem no meio entre a porta
Sem história pra contar
Não importa onde eu vá
Pois pra onde eu vou eu tô
E onde eu vou você tá
Não me encaixo nem em mim
Queria tuas pernas quentes
E falar e sussurrar
Nos tecidos do teu ser
Brancas vozes transparentes
fica vai, pode ficar.
Mas não se assuste não
Com todo meu arrudeio
Poeta faz drama assim
Coisa de gritar calado
Copo vazio, meio cheio
Tudo dói bem demorado
Desce assim, sem fim
Sem freio
Queria dizer que curou
Mas teria aí mentido
Meu amor só tá guardado
Papel-presente enrolado
Aberto no meio e rasgado
E nunca, nunca acabou