CABEIRO

Um passo de longo caminho,

as pernas curtas cheias de espinho,

atravesso a madrugada

insone do tempo perdido.

Quando tantos estão na vanguarda

é difícil seguir sozinho

com minhas patas viradas,

minhas linhas vazias...

Aprendi muito vocábulo

para saber falar errado:

concomitantemente, escaninho,

deletério, tartamudo, poluto,

muitas eram as palavras tardias

que repetia papagueando.

Não à toa de seguidos avisos

as pessoas foram passando,

o mundo foi diminuindo,

o sonho eclipsando.

Você passou por mim

e me deixou os anos,

eu quis te seguir,

mas não tinha planos,

não tinha emprego, dinheiro,

não tinha sequer diploma,

não tinha um puto na conta,

estava cheio de razão inútil

de como fazer referência,

como ganhar no discurso,

como tecer um poema,

tudo pra não parecer burro.

Você passou por mim

e eu não tinha como

ir atrás de ti,

não podia frequentar restaurantes,

nem dividir uma cerveja,

nem pedir um Uber,

o que quer que seja

tudo estava contado,

tudo era besteira.

Você passou por mim

e aquela sensação

de vida inteira

deixou meu coração

de partida, desde o começo,

ali tive noção:

não existe amor sem dinheiro,

não tem paixão, é desespero,

é ilusão nem passageira,

desocupada, desorientada, vaga.

Não tenho mais como chegar em ti,

perdi meu tempo, não tenho estrada.

Eu te agradeço a precisão do relógio,

já vou tarde, quem sabe eu tenha sorte.

Diego Duarte
Enviado por Diego Duarte em 21/06/2023
Reeditado em 21/06/2023
Código do texto: T7819013
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