Inventário do Desamor

Deixo contigo meu sangue

meus livros e minhas horas.

E a dor cansada na insônia

contra o lençol das demoras.

Deixo a paz que eu encontrei

mas me fugiu entre os dedos.

E a chave surda e sem uso

da gaveta dos meus medos.

Deixo perdido um poema

e não por esquecimento:

mas pra que um dia eu te encontre

na leve pauta dos ventos.

Deixo contigo meu ventre

meus olhos, minhas entranhas.

E com mãos nuas, reflito:

- Perde mais quem hoje ganha?

Deixo contigo meus beijos

meu suor, meu desabrigo.

Deixo roupas, documentos.

De meu, nada irá comigo.

Deixo a sombra, de teimosa.

Deixo as fotos, deixo a casa.

Do poço mais infinito

só levo a alma, presa e rasa.