Jardim dos Queridos

A vida é um tablado de surpresas.

Um dia é um rumo atrevido,

noutro parado.

A paz nesse azevem

de contrários

é suspeita.

 

Que paz pode haver

se o rumo não se define

pra que lado quer ir?

E agrura a dor -

de todos os lados. 

 

Não sobram nem meias paredes

ou cortinas zanzanadas pelo tempo

para guardar o indefinido

que corre por este rumo incerto

e inesperado que torque

a noite de cada um. 

 

O balbuciar na rede

é canto de esperas

e pausas para o afã

das discórdias e ódios

que nos assolam. 

 

E fica o sol, amorfo

entre os lençóis sancristos

pensando nela com esperança.

Dádiva dos persistentes,

clama perdão pelo afã da guerra.

 

E fica ela, recostada, olhos longínquos,

nos travesseiros que assistem,

impávidos, as lutas de cada dia.

São tantas batalhas,

em que agrura a dor,

que o mundo perdeu as contas. 

 

E a vida os ensina:

amor como esse não há outro igual.

Nenhum outro igual surgirá

entre o desejo e o ocaso que os separa.

Mesmo que caminhem

mil léguas de amor,

ou deixarem, mais uma vez,

o tempo os trair,

não encontrarão outro igual.

 

Esse tem nome

e abranda o orvalho e a dor.

 

Esse faz com que nos tornemos

corretores de amor

na vida cheia de perdas e derrotas

que zera esperas e faz costume

com areias quentes

a assolar dois sóis

que brilham sua luz

num mesmo jardim -

jardim dos esquecidos da dor,

jardim dos queridos,

jardim de balbuciar na rede,

olhos prementes de sonhos,

palavras e sussurros de amor.