Nave do tempo

Achei minha felicidade

Minha carne de cajú

Minhas horinhas de descuido

Só tem tú

Não importa onde esteja,

pedaço de terra,

país, cidade

Pense, beije, veja.

Que morde faceira e desfaz desavença

Que rompe rompe certeira, desfaz nó, desfaz crença

Que derrama vermelho e sai num piscar, sem licença

Você me dançou

Se esparramou em mim

Me pegou pelo pé

Que nem princesa do Daomé

numa toada apertada

num compasso dobrado

Que eu nunca tinha visto

e aí o chão gritou

"Pisa devagar qué pr'areia sentar"

Mas tu nem ligou

E continuou

Doeu um bocado

Ver tua saia rodar no reboco

E na mesma noite

Com outro dançar

E beijar

E sorrir

Doeu mais um pouco

Fui menino e desatento

Na ânsia do vento

Na fome de afago

Arrenego de quem disse

Que o nosso amor começou

Ele agora está mais fraco

Do que quando terminou

E eu afogado em intento

Deixei fazer dança das flores

No meu pensamento

Teria pintado o mundo

de orquídeas,

de música

Pio de "passarim"

Perfume de alecrim

Facinho assim

Se quisesse

Se dissesse

Um sonoro e tardio

"Faça"

Cingiria sem pestanejar

O mundo todinho de prata

E nessa queda dágua de quereres

Não importa a mata virgem

Ou desenho de belos seres

Vai tudo embora

Na ânsia do vento

Na fome de afago

Na nave do tempo.