A andorinha acastanhada
(I)
Quando o inverno vem gear
O verdor da temporada,
Ouço um canto começar
Da andorinha acastanhada,
E dela fui me lembrar,
Se não acho coisa errada,
Que seu canto faz soar
Bem a voz de minha amada.
(II)
Levantado à perceber
O trinado na boscagem,
Minha alma devia ver,
Apesar da prava aragem,
A andorinha em bel-prazer
Lá cantando na folhagem,
Mas não a pude entrever
Nem no ramo e na copagem.
(III)
E tão triste a me afastar
Da floresta adocicada,
Eu temo não encontrar
Quem semelha minha amada,
Mas eu não pude escapar,
Como se fora encantada,
Do verde e airoso lugar
Como gente aprisionada.
(IV)
E eu senti engrandecer
O meu tormento selvagem,
Aflito estava a volver,
Razoando na pastagem,
Mas não deixei-me vencer
De sofrimento ou bobagem
E tornei ao meu querer
Pela andorinha selvagem.
(V)
E indo de novo a buscar
Fui pela terra gelada,
A que evitei caminhar
Pela mente acovardada,
Novamente ouvi cantar
A mais doce serenada,
Tão logo fui me animar
Achando tê-la encontrada.
(VI)
No caminho vi descer,
Como esquisita miragem,
Tão perto de meu prazer
A clara e bela plumagem
E eu bem falhava de crer
Que na vil seca ramagem
Pudesse ela bem viver,
E a perguntei da romagem.
(VII)
'Alexandre, vou cantar
Na sazão doce e amargada,
E bem podem me encontrar,
Na vil ou na boa estrada.
Mau homem pode me achar
Logo e me ter desditada,
Mas o bom que me encontrar
Terá a ventura dobrada.'
(VIII)
Ao seu conselho fui ver
O motivo da viagem.
A andorinha fez-me crer
Em tal maviosa mensagem
Que bem valera eu sofrer.
E num belo arco em ramagem
Mandou-me lá suceder
E estar na bela paisagem.
(Tornada)
Bom amor a aconselhar,
De andorinha encarnada,
Que podemos suportar
Pela mercê melhorada.