INTRADUZÍVEL

Há de haver alguma palavra,

um signo linguístico perdido

que te signifique como sinto.

Quando a torre de tijolos ruiu

e dividiu a humanidade em tribos,

no dia que o continente se partiu

e pela última vez nos vimos,

foi quando a palavra surgiu,

seguindo o curso do rio,

na fresta de cada hora

que foi se repetindo,

intocável e insonora,

afrontando a fúria de Deus!

Diziam-na em festas ímpias,

quando o medo lhes pedia,

quando a tempestade rugia,

quando a mente insana jazia,

cada um ouvia na própria língua,

já foi dita no protoindo-europeu,

já a profanaram em latim,

já a esqueceram em português.

Eu escuto seus fonemas

nos meus batimentos cardíacos,

quando suspiro teus pensamentos,

enquanto me alimento do teu riso.

Ainda a pouco estava comigo

entrecortando o ritmo marítimo

com que a chuva tocava a telha,

nitidamente era a palavra antiga

na qual o símbolo foi batizado

em sons que não estão na tabela,

sons que são somente dela

e só o coração há de ouvir,

que eu não ouso traduzir.

Diego Duarte
Enviado por Diego Duarte em 22/04/2022
Reeditado em 22/04/2022
Código do texto: T7500878
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