Na sombra das palavras

sobre o texto que te escrevi e te entreguei,

tem uma coisa que não tive a chance de contar:

aquelas não eram as palavras que

eu realmente queria que você lesse.

assim como o presente

de alguém que visita um prisioneiro,

o que eu verdadeiramente quis entregar não estava na superfície;

o que havia de visível não passava de um disfarce.

queria que tivesse sido capaz de ler as entrelinhas,

de enxergar as letras que, de tão miúdas, sequer estavam lá.

queria que tivesse entendido que,

quando deixo metade de uma folha em branco,

não é porque não tenho mais nada a escrever-te

e sim porque espero que a preencha em resposta.

eu queria ter lido Clarice quando era pequeno

ela me força a olhar para as sombras que as palavras produzem

quando te escrevo e te entrego, não é apenas porque sou brega

embora essa seja uma especulação aceitável

mas sim porque estou em clima de doação

e papel e poesia vêm para preceder corpo e alma.

Expedito Allison
Enviado por Expedito Allison em 08/01/2022
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