DOIS VERSOS

José António Gonçalves

Nas coisas que te digo há

uma mão cheia de sofismas

inconvenientes

para a minha condição de pretendente

aos índices do amor

Se penso em casa logo recuo

como se um arrepio me impedisse

os atrevimentos

que o sol nos traz sempre ao corpo

num punhado de folhas mortas

Então as palavras insignificantes

buscam grandeza nas minhas falas

extenuadas

reproduzindo um interminável Outono

sem metáforas e despido de árvores

Não sei escolher os vocábulos

certos para reescrever-te os poemas

como dantes

despertando o animal que me habita

para os perigos do silêncio

Por isso deixo-me ficar por aqui

enquanto congeminas como ludibriar

a sentença do Éden acordada pela maçã

prisioneiro de apenas dois versos:

como vês eis-me quieto à tua espera

à luz do dia na estrada de onde não fugi

Agora sei como o Inverno é frio e temo

o gume das armadilhas da floresta citadina

onde sozinho hiberno até à próxima primavera

José António Gonçalves

(inédito 22.11.04)

JAG
Enviado por JAG em 19/11/2005
Código do texto: T73430