"Infecta-me com o teu amor"
Li num poema adormecido
Na memória que acabei por acordar
Na altura da peste
Que coincidiu com a altura
Em que nos voltámos a falar
O que fez começar a revolução
Sanitária
De nós dois
Na distância segura
Da minha solidão
Pois se eras afinal a doença e não a cura
Eu preferia estar doente
Porque éramos os dois um
Com esta infecção
Sim
Foi o tempo e a idade
Que me despojou de lirismos
Eras a doença
Ainda o és
Mas é de Ti
Que eu mais preciso
Porque saudável
Não tenho estes sintomas
De sentir o corpo a arder
De uma insónia
Que não me deixa sequer adormecer
De sentir borboletas no estômago
Sentir esta dor
Que também é prazer
Por isso prefiro a doença da proximidade
À cura de te perder
E eu bem tentei ser o mesmo
Tentei que as imagens
Do que escrevo
Fossem as do tempo pré pandemia
Onde essas imagens eram belas
Ou tentavam ser
Mas
Meu amor
Minha doença
O mundo mudou
Pelo menos por agora
E o bicho devorou a minha imaginação
Ou se calhar me deu a lucidez
Para entender
Que por me matares por dentro
É assim que tenho que te descrever
Mas sabes
Aquele brilho nos meus olhos
De que tanto gostas
Só aparece
Quando decides aparecer...