E no princípio havia a mulher

E se não existisse nenhum Adão?

E se Eva comesse aquelas maçãs

Sem receber nenhuma repreensão?

E se a descoberta naquele morder

Fosse a de um prazer beatífico?

E se a criação desse não viesse

De um nascimento parodínico¹?

E se o sentir, provar, morder, beijar

Fosse, tudo isso, um ato inefável?

E se na verdade o pecado estivesse

No olhar que abomina o desejável?

E se estivéssemos todos nus no Éden

Pra que nos víssemos naturalmente?

E se nosso querer fosse, plenamente,

Só pelas humanidades que nos regem?

E se o que é do humano nascesse

Por causa da minha benquerença?

E se não houvesse a tal onipresença

Para vigiar o que se cometesse?

E se Eva fosse eu? E se as maçãs

Fossem as que você tem no rosto?

E se o que eu sentisse no seu gosto

Fosse o sabor de uma vontade vã?

E se, apesar de tudo que se disse,

O Divino não me cedesse você?

¹Parodínico, relativo a parodinia: conjunto de dores do parto; "nascimento não parodínico": nascimento sem dor.

Raphaela Vaz
Enviado por Raphaela Vaz em 12/03/2021
Reeditado em 13/04/2021
Código do texto: T7205142
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