Paixão voraz

Escara do cruel fagedenismo
(bulímica paixão que me devora),
eu anoiteço em claro junto às horas,
como uma luz no fundo do abismo.

Passo pelos ocasos e auroras,
no fio da paixão me atassalha:
a dor, que punge o peito qual navalha,
e se despede, e nunca vai embora.

Sou hoje, do que fui, uma migalha:
pirilampo, sem luz, na escuridão,
a tatear, nos túneis da razão,
onde possa despir minha mortalha.

Pudesse encouraçar meu coração!
Pudesse amordaçar o meu desejo!
Quiçá me libertasse, em um lampejo,
da gula compulsiva da paixão.

E sepultar na boca, em um só beijo,
todos os que pensei em dizer não.
Herculano Alencar
Enviado por Herculano Alencar em 27/01/2021
Reeditado em 27/01/2021
Código do texto: T7169882
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