Duras Penas
Por Nemilson Vieira de Morais (*)
Veja no que deu a minha história de amor com a Dra. Helísa; uma solteirona do meu bairro que abraçou a magistratura numa missão de vida e detestava os 'apressados'. Não permitia que o sujeito passasse, o carro adiante dos bois.
Eu solteirão também; sem bons modos que, às vezes me comportava como um adolescente descobrindo o mundo.
Começamos a nos olhar pela rua; um sorriso de lá outro de cá; um aceno de mãos, um hoi correspondido e nos afinizamos.
No nosso primeiro encontro, com muita cede ao pote, não contive meus desejos e bebi da sua água: roubei dela um beijo na face e um cheiro no cangote.
Ela não gostou, fez cara feia; e acredite: por esse crime fui parar na cadeia.
Ela fez uma representação
contra mim por, importunação... e a enviou a si mesma (juíza do caso).
Enquadrado num crime hediondo: sem direito de defesa fui conduzido por seus caprichos à prisão do isolamento, e da incomunicabilidade.
Após um tempo, nessa privação de liberdade, no seu tribunal fui condenado a não mais, sequer num gesto ou num poema, expressar meus sentimentos, meus dilemas...
Enclausurado no calabouço escuro e frio, do meu mundo interior, tive por companhia: o silêncio, a melancolia, a dor...
Que crime foi o meu pra receber tão duras penas?!
O tempo passou e eu fiquei calado (triste, desolado) a pensar em nós... nas noites mal dormidas, sob o olhar das estrelas, conversava com as paredes.
Nos dias amargos, pelo vão d'alma, observava às ondas bravias se chocarem contra o cais. A minha vontade era de navegar pelos mares dos meus propósitos; mas só via 'navios em portos atracados'.
Um dia, com pesar na consciência, após rever seus conceitos, e o meu perfil de apenado, ela quiz atenuar a minha pena; ressocializar-me...
Passou-me para o regime domiciliar com alegações deu ter mais liberdade, sol, claridade e retorno diário à minha residência.
Não ressocializou-me.
Pois essa liberdade não me deu acesso a ela.
A incidência solar, a claridade, não ajudou tanto, pois não pude contemplar a luz do seus olhos a mim, em pleno dia.
Também não fui agraciado ao retornar à minha residência, diariamente; pois não era um lar. Não havia nela a sua presença; o calor dos seus abraços.
A luz no fim do túnel surgiu-me: no convite à estar na sua presença numa audiência extraordinária.
Dia chegado, a sós com ela no tribunal, percebi um sisco em seus olhos da cor da noite: e logo entendi que a audiência tratava-se de uma retratação sua, um pedido de perdão; por seu julgamento a mim, ao arrepio da lei: sem o devido processo legal...
Perdoei-lhe prontamente.
Nos levantamos de nossos assentos e corremos para o braço...
De pronto, ela retirou do repouso sua pena e inserriu-a no tinteiro e assinou a minha absolvição. — A anulação da minha sentença; e arquivou os meus processos e me aceitou como eu era; pôs um fim ao nosso sofrer, nessa absolvição
A partir daquele instante, o nosso sentimento foi um só. —Na celebração da liberdade e da alegria do estar juntos em amor!
Que crime há, que não possa ser perdoado?!
*Nemilson Vieira de Morais,
Gestor Ambiental/Acadêmico Literário da ANELCA e ALB/MG.