COLETA
COLETA I -- 12 JAN 18
Caso pudesse, guardaria minhas noites
para gastá-las totalmente do teu lado:
teria um cofre ao tempo arrebatado,
com coquetéis de minúsculos pernoites.
Tomaria dos segundos os afoites,
esses que correm em suor apalermado,
após de longos sonhos despertado,
por um ruído ou por silêncio nos açoites.
Tantos minutos se desperdiça assim!
Nos intervalos a girar sobre o colchão,
no afofar de nosso travesseiro,
antes do sono queimar seu estopim
e novamente perder-me em comoção,
quando a quimera me devora por inteiro...
COLETA II
Eu tomaria os momentos dessa espera
nos interstícios do dia consumidos
por quaisquer visitas inúteis perseguidos
ou se os canais da tevê seguem a esfera
dos comerciais em que a cobiça deblatera
ou nos momentos em que são interrompidos
os programas por discursos malqueridos,
quando o desgosto a nosso lado persevera!
Ou quando à noite é preciso levantar
para abrir ou então fechar janela,
ligar ou desligar ventiladores
ou as cobertas sobre os pés ir arrumar,
quando centelha anuncia uma procela
ou ventania nos causa alguns temores.
COLETA III
Por acaso alguma vez já calculaste
esses momentos perdidos em tais dias,
essas chispas de marasmo tão vazias,
durante as quais quase nada realizaste?
Ou os instantes que ao letargo consagraste,
atrás das pálpebras em diáfanas orgias,
imagens plúmbeas em que mal pensarias,
que em seu conjunto causam tal desgaste?
Ah, se eu pudesse! Para mim guardava tudo
para esconder em frascos de perfume,
que só abriria quando estivesses perto!...
Correndo os dedos por tua pele de veludo,
vendo teus olhos cintilantes como lume,
aberto o cofre e o coração aberto!...