Amor Sem Poesia

O túmulo, no qual em sonho me ponho a dormir

Inquieto, sussurra uma noturna elucubração:

"De que vale bela poesia como esta?"

— Perguntou-me a terrível assombração.—

"De que vale poesia bela como esta

Se para tua amada nada escreves?!"

Ó danação! Te responderei sem entreves,

— Porque o túmulo sempre há de entender o poeta.—

Minha poesia, ó túmulo, é de uma tristeza indiscreta:

Só consigo escrever quando profundamente triste!

No entanto a minha amada, minha doce donzela

Me afasta do enriste de tão tenebroso ofício!

Assim sendo, para mim parece vantajoso sacrifício:

Ela me rejubila, faz sentir-me feliz e estonteante!

Sinto a ventura de sua bonança qual infante e

Em seu sorriso, em sua pele me ponho a divagar

Tanto, que da angústia me esqueço o suplício, ah!

A maior prova de amor, para mim, poeta dos infernos,

É, para a pessoa que, amada tendo como minha,

Não escrever uma única linha em meus terríveis cadernos!

Raul Brasil
Enviado por Raul Brasil em 01/07/2020
Código do texto: T6992797
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