EMANUELLE
Eu vi as tuas lágrimas,
caiu-se as máscaras
e te percebi inteira!
No virar das páginas:
a mulher verdadeira
cravada de marcas
na selva da sala.
Percebi de pleno
os olhos serenos
cheios de água,
o turbilhão estava feito
para eu mergulhar...
Não tive dúvida,
talvez meu erro,
deveria perguntar,
foi paixão súbita
reflexo do teu olhar!
Um mar de gentileza
no qual fui banhado,
o espírito afogado
passei a te respirar,
inteiramente correnteza
eu te quis navegar.
O rio: beleza indígena,
a longa cabeleira
descendo a cachoeira
lábios de enigma,
as vezes borboleta,
as vezes guaraná.
Quando se abria
penetrava alvorada
a mata fria;
da jangada te seguia,
via teu sinais
na ponta do nariz:
estrelas marítimas.
Descia o afluente
mistério transcendente,
cordão de lua virada,
pela tez nativa
borbotões de olho d’água
duas torvelinhas
que me tragam pra si,
no largo calmo
flutua a vitória-régia
onde a história reza
que ela recebeu a vida.
A frente se divide o flúmen
onde o ciclo se finda
ora em rubra nuvem,
ora em bruta poesia,
a carne inteira desfalece
se banhando em pés-d'água,
o milagre se reflete:
uns te chamam Uiara,
eu te chamo Emanuelle.
Encantado, maravilhado,
arrebatado de desejo,
queria te abraçar
encher teus lábios
de muitos beijos,
afagar os teus cabelos
te aninhar no meu peito:
vem, pode chorar
eu te protejo!
Queria beber teu riso
Guarnecer-te de enfeite:
toma um doce, se deleite
tua felicidade é meu desígnio,
esquece essa gente desalmada
que vocifera contra ti!
Me cerquei de tua mágica
era o arco-íris, a tiara,
o óculos, o cordão; curuminha
tu te ria da minha palhaçada,
de cada verso que te escrevia,
contava o tempo pra te contar
mas só vinha verso, maldito verso,
maldito olhar de poesia!
Maldito eu poeta maldito!
Tentaram me ajudar,
uniram-nos na festa
ah meu eu poeta!
Foi um lindo sonho,
a vida é como é:
eu te vejo mulher,
tu não me vê homem.
Eu nunca tive chance!
No teu imaginário
eu sou pássaro
voando até o sol:
não bastam asas.
Um indivíduo
para caminhar:
não de mãos dadas!
Um bom amigo
para confidenciar
segredos, não beijos.
Não poderias me amar
e eu respeito.
hoje enquanto escrevo
versos que não lerás
penso que assim é o medo,
nos devora em silêncio
o desacontecido
e está tudo bem
não ter me querido,
não foste a primeira
nem será a última:
que eu resolva comigo
o que quer que seja!
Eu precisava dizer isso,
embora ainda te deseje
(as pernas tremem
só de pensar)
o rio segue rumo ao futuro
e não tem margem.