Amor de outono
O amor se apresentou a mim
Altivo e perspicaz
Chegou sem alarde
O amor tinha medo
Eu também tenho, amor
Contudo, também tenho coragem
O amor quis partir
Sem se despedir
Não levou em conta o que eu queria
Não fez concessões
O trágico do amor é mesmo isso
A autonomia
A independência
A não correspondência
O amor é mesmo vário
E para o amor talvez eu não passe de uma performática sexual
Que o atravessava com o olhar de quem ardia de desejo
Desse olhar amor, te asseguro: jamais se esquecerá
O amor é temporário
Meu tempo não é o tempo do amor
Nossas expectativas são pautadas nos desencontros
E nas nossas carências em comum
O amor lê Nietzsche
E se o amor acredita em si mesmo como posse
Porque é “o amor”
Saberá, portanto que não poderia ser possuída
Porque já possuo a mim mesma
O amor se defende
Sua defesa é agressiva
Porque eu haveria de querer um amor assim?
De certo, se é verdade que o amor é construção
Eu construí o amor
Com minhas próprias mãos
Solitariamente
O amor me elevou
E me desenterrou muitas questões
Que papel terá o amor solitário?
Trazer-me de volta a poesia após um longo hiato?
Por sorte, terá o amor um outro amor?
Ou terei eu o afetado tão severamente
Que não lhe dei outra saída?
Fugir, porque já não carecia de lutar
Eu sou tão pouco para o amor
Que não tive sequer direito a uma conversa justa
Para mim eu sou o bastante amor
Te queria para agregar
O amor e eu
Ambos, desistimos
A motivação dele, desconheço
A minha foi não ter escolha
Eu desisti, amor
Mas, desistir de escrever não posso
Não enquanto eu sentir
E eu ainda sinto
No entanto, por que isso haveria de lhe interessar?