Amor de outono

O amor se apresentou a mim

Altivo e perspicaz

Chegou sem alarde

O amor tinha medo

Eu também tenho, amor

Contudo, também tenho coragem

O amor quis partir

Sem se despedir

Não levou em conta o que eu queria

Não fez concessões

O trágico do amor é mesmo isso

A autonomia

A independência

A não correspondência

O amor é mesmo vário

E para o amor talvez eu não passe de uma performática sexual

Que o atravessava com o olhar de quem ardia de desejo

Desse olhar amor, te asseguro: jamais se esquecerá

O amor é temporário

Meu tempo não é o tempo do amor

Nossas expectativas são pautadas nos desencontros

E nas nossas carências em comum

O amor lê Nietzsche

E se o amor acredita em si mesmo como posse

Porque é “o amor”

Saberá, portanto que não poderia ser possuída

Porque já possuo a mim mesma

O amor se defende

Sua defesa é agressiva

Porque eu haveria de querer um amor assim?

De certo, se é verdade que o amor é construção

Eu construí o amor

Com minhas próprias mãos

Solitariamente

O amor me elevou

E me desenterrou muitas questões

Que papel terá o amor solitário?

Trazer-me de volta a poesia após um longo hiato?

Por sorte, terá o amor um outro amor?

Ou terei eu o afetado tão severamente

Que não lhe dei outra saída?

Fugir, porque já não carecia de lutar

Eu sou tão pouco para o amor

Que não tive sequer direito a uma conversa justa

Para mim eu sou o bastante amor

Te queria para agregar

O amor e eu

Ambos, desistimos

A motivação dele, desconheço

A minha foi não ter escolha

Eu desisti, amor

Mas, desistir de escrever não posso

Não enquanto eu sentir

E eu ainda sinto

No entanto, por que isso haveria de lhe interessar?

Mariany Mendes
Enviado por Mariany Mendes em 11/05/2020
Reeditado em 11/05/2020
Código do texto: T6943990
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