Meu coração já não te pertence mais.
Durante muito tempo meu coração foi o lugar onde você fez morada. Plantou em mim uma espécie de trepadeira e deixou crescer. Ela tomou conta de todo lugar. Ocupou cada cantinho obscuro e me encheu de você. Eu reguei com amor, adubei com carinho e tudo em mim era seu. Eu era uma pessoa feliz e completa. Recheada de você por todos os lados.
Mas aí, você decidiu que não queria mais continuar aqui. Pegou suas coisas e partiu. E eu fiquei, envolta num emaranhado de dor, tristeza e trepadeira por todos os lados.
No início eu continuei regando e adubando na certeza de que você voltaria. Imaginei inúmeras desculpas e até te perdoei por elas. Esperei você voltar com todas as portas da casa abertas, inclusive a do meu coração. Meu precioso jardim.
Alguns anos mais tarde, com a percepção iminente de que você não voltaria eu olhei bem para dentro de mim e vi aquela trepadeira verde sem cor, murcha, cheia de machucados, mas que ainda continuava ali. Mas dessa vez me intoxicando, entranhada tão profundamente que julgava ser incapaz de arrancar.
Você tinha partido e tinha me deixado com essa “coisa” dentro de mim para me lembrar de você. Meu coração precisava de cuidados, então eu encontrei um jardineiro.
Confesso que foi difícil. Foi difícil deixá-lo entrar e procurar espaço naquilo tudo que você ocupava. Foi difícil ver cada folha daquela trepadeira cair e ir embora com o vento. Foi difícil ver que, em cada folha ausente, nascia uma rosa. Branca. Pura. Ingênua. O jardineiro foi cuidando de mim com persistência e carinho. Adubava as rosas com calma e paciência. Regava com esperanças. Depois de um tempo não era mais tão difícil ver as rosas. Era até bonito, pois elas foram ocupando um lugar que estava feio e abandonado.
O jardineiro plantou varias outras rosas: amarelas, para a felicidade; azuis, para os dias em que precisava de serenidade; lilases, para me dar energia e rosas cor de rosa, para que eu amasse novamente. Foi quando eu vi, bem no meio do jardim, uma rosa vermelha linda, cheia de vida, de perfume, de calor. Destinada àquele que soube cuidar de verdade de mim. Que cativou cada pedacinho meu, que mereceu cada flor daquele jardim. Ele não me possuiu, nem me intoxicou, nem me plantou uma praga. Não. Ele me plantou amor.
E meu coração já não te pertence mais.
Laila Oliveira.