continua nos próximos jardins
de onde vem tal calma
tal paciência?
sempre ouço isso de quem se detém
para me ler e ouvir
seja numa conversa de bar
ou num texto breve ou longo
numa rede social qualquer
mais preocupado em simplesmente ser
do que em se fazer entender
se surpreendem ainda mais
quando falo e escrevo
sobre ela
aquela que ninguém conhece
mas sobre a qual muito se leu e ouviu
não há muito o que dizer
é que o vento me fez aprender
a amar e respeitar tudo aquilo que me alimenta
mesmo que talvez sob algum contragosto
porque é algo que não depende de abrigo
que mora dentro de si
falta o cenário
o público
a trilha sonora
e alguém a dirigir
eu sei
mas existe aqui
dentro
como um roteiro manuscrito
esquecido numa gaveta
de um armário qualquer
esperando que um dia uma mão de lá o tire
toda amassado e escurecido
mesmo que por tê-lo confundido
com um pacote de filtro para café
e o leia até o fim
e também as notas de rodapé
que mais confundem que explanam
e antes do virar da última página
talvez aquela leitora pare
volte lá para o primeiro capítulo
e onde se lê o nome de certa personagem
sempre passe um risco meio torto
e sobre ele escreva o seu próprio
talvez todo o enredo mude
não dá para saber
mas a essência da história
ela
que antes se desenhava em outra
mas tinha tudo o que era seu
em sua forma
estará lá
e até o último instante
embora o grande objetivo deste que escreve
tenha sido desde o início
ajudar a tecer uma história
que não se obrigasse a um fim
e que talvez pudesse sair de cena assim:
continua nos próximos jardins