continua nos próximos jardins

de onde vem tal calma

tal paciência?

sempre ouço isso de quem se detém

para me ler e ouvir

seja numa conversa de bar

ou num texto breve ou longo

numa rede social qualquer

mais preocupado em simplesmente ser

do que em se fazer entender

se surpreendem ainda mais

quando falo e escrevo

sobre ela

aquela que ninguém conhece

mas sobre a qual muito se leu e ouviu

não há muito o que dizer

é que o vento me fez aprender

a amar e respeitar tudo aquilo que me alimenta

mesmo que talvez sob algum contragosto

porque é algo que não depende de abrigo

que mora dentro de si

falta o cenário

o público

a trilha sonora

e alguém a dirigir

eu sei

mas existe aqui

dentro

como um roteiro manuscrito

esquecido numa gaveta

de um armário qualquer

esperando que um dia uma mão de lá o tire

toda amassado e escurecido

mesmo que por tê-lo confundido

com um pacote de filtro para café

e o leia até o fim

e também as notas de rodapé

que mais confundem que explanam

e antes do virar da última página

talvez aquela leitora pare

volte lá para o primeiro capítulo

e onde se lê o nome de certa personagem

sempre passe um risco meio torto

e sobre ele escreva o seu próprio

talvez todo o enredo mude

não dá para saber

mas a essência da história

ela

que antes se desenhava em outra

mas tinha tudo o que era seu

em sua forma

estará lá

e até o último instante

embora o grande objetivo deste que escreve

tenha sido desde o início

ajudar a tecer uma história

que não se obrigasse a um fim

e que talvez pudesse sair de cena assim:

continua nos próximos jardins

Albion Vasconcelos
Enviado por Albion Vasconcelos em 20/04/2020
Código do texto: T6923195
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2020. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.