NÓMADA
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Montei meus haveres sobre o dorso do meu camelo,
Embrulhei-os em macios tapetes de Tabriz e Kashan,
de seda e de lã.
Atei tudo muito bem atado
e fiz-me ao largo
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Desci a montanha. Transpus o vale.
Cruzei, caudaloso, o tormentoso rio
na curva apertada de bambus e calhaus
onde vi que podia passá-lo a vau –
E novamente subi a montanha.
Vencendo o cansaço, iludindo o sono,
levando o gado às pastagens de outono
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Da lã macia e grosseira dos meus carneiros
podia enfim erigir minha tenda.
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Da minha algibeira tirei a flauta, fiel companheira –
A plenos pulmões soltei, lancei ao ar puro
e às areias e lacraus do turvo deserto
a eterna canção dos mitos e das lendas
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Quando, finalmente, desfiz os embrulhos,
viram com espanto meus olhos maduros
que as minhas dores já não estavam lá
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© Myriam Jubilot de Carvalho
Almada 3 de Março de 2005